Segunda-feira, 15 de Dezembro de 2025
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Chamada para artigos: História em disputa

Data de abertura: Data de encerramento: Países: Portugal

Chamada para artigos

Chamada aberta para a Práticas da História: Journal on Theory, Historiography and Uses of the PastHistória em disputa: usos, instrumentalizações e ataques à disciplina histórica na era da nova extrema-direita

Editores: Felipe Brandi (IHC — NOVA FCSH / IN2PAST), Daniel Pereira (PUC – Rio de Janeiro), Lidiane Soares Rodrigues (Universidade Federal do ABC, São Paulo), Margarida Rendeiro (CHAM – NOVA FCSH e Universidade Lusíada), Miguel Palmeira (Universidade de São Paulo), Pedro Martins (IHC — NOVA FCSH / IN2PAST)

Nos últimos anos, a historiografia e o ensino da história têm sido atravessados por um fenómeno preocupante: a intensificação de uma dinâmica generalizada de instrumentalização política do passado por parte da nova extrema-direita. Amplamente apoiada nos novos media, essa dinâmica tem sido acompanhada por uma sistemática deslegitimação do conhecimento historiográfico produzido por académicos, frequentemente retratados como “doutrinadores de esquerda”. Trata-se de uma ofensiva transnacional e radical, que opera com notável rapidez e intensidade, utilizando estratégias sofisticadas de disseminação digital.

Neste contexto, as redes sociais desempenham um papel central ao moldarem a sensibilidade histórica contemporânea. Espaços regidos por ruídos algorítmicos, esses ambientes favorecem a circulação massiva de conteúdos historicamente distorcidos, dirigidos a públicos muitas vezes desprovidos de ferramentas críticas para avaliar a validade epistemológica das informações que consomem. Além disso, a adesão acrítica, por parte de certos setores do mundo académico, aos novos media levanta sérias questões sobre os modos contemporâneos de transmissão do conhecimento histórico.

Ainda que o uso político do passado não seja exclusivo da extrema-direita, o modo como esta o mobiliza na atualidade exige atenção particular. Três traços tornam este fenómeno especialmente inquietante: (1) um anti-intelectualismo agressivo e hostil à universidade, que combina reinterpretações tendenciosas do passado com ataques diretos à historiografia académica; (2) a tentativa de relativizar crimes históricos e fragilizar princípios democráticos, legitimando discursos autoritários e excludentes; (3) uma estratégia comunicacional intensiva baseada no uso das redes sociais e das tecnologias digitais, tanto como canais de difusão quanto como instrumentos de mobilização política.

A nova extrema-direita compreendeu que a história é um território de conflito simbólico e ideológico. Ao disputar o passado, procura moldar subjetividades e legitimar um projeto político que constrói uma continuidade imaginária entre um passado glorioso, um presente ameaçado e um futuro redentor. Essa narrativa pretende apagar culpas, silenciar vítimas e promover uma visão distorcida da história, muitas vezes glorificando figuras autoritárias, negando genocídios, e reabilitando práticas opressivas como o colonialismo, a escravatura e os regimes ditatoriais do século XX. Além disso, observam-se tentativas de apropriação estereotipada de períodos históricos distantes — como a Antiguidade e a Idade Média — com o objetivo de reforçar identidades chauvinistas, patriarcais, misóginas, homofóbicas e transfóbicas, bem como de invisibilizar mulheres e grupos étnicos historicamente marginalizados. Essa guerra cultural alimenta-se de uma crise mais ampla de autoridade epistémica, marcada pelo enfraquecimento das instituições tradicionais de produção e validação do conhecimento histórico e pela consolidação de uma lógica de pós-verdade, na qual a complexidade é rejeitada e a dúvida é explorada como instrumento de manipulação.

Diante disso, coloca-se uma série de interrogações cruciais: por que a extrema-direita contemporânea investe tanto na disputa pelas narrativas do passado? Que papel desempenha a história na sua estratégia de poder? Que tecnologias e meios comunicacionais sustentam essa ofensiva? E de que forma o domínio das representações do que foi se converte em poder sobre o que é e sobre o que poderá vir a ser?

Parte da dificuldade dos historiadores em responder a essas questões pode residir na consciência de que a própria disciplina histórica, desde suas origens, esteve ligada à legitimação de projetos de poder, à construção de mitologias de origem, à justificação de conquistas e ao fomento de identidades excludentes. No entanto, se a história profissional não é neutra, ela é responsável. Compromete-se com o rigor crítico e com uma atuação pública consciente de suas responsabilidades intelectuais, sociais e éticas.

Nesse contexto, a Práticas da História lança este dossier como um convite à reflexão crítica e coletiva sobre os usos políticos do passado e os desafios enfrentados pela historiografia contemporânea. Propõe-se mapear as formas de instrumentalização ideológica da história e pensar como o ofício do historiador pode resistir a discursos dogmáticos, panfletários e autoritários. Pretende, ainda, contribuir para a construção de respostas coletivas que fortaleçam a historiografia profissional, protejam o ensino da história e defendam uma memória plural como ferramenta de resistência democrática.

Convidam-se, assim, investigadores/as a submeter propostas de artigos originais (até 500 palavras) até 17 de setembro de 2025, através do site da revista. As propostas aceites serão comunicadas até 10 de outubro, e os artigos completos deverão ser submetidos até 15 de janeiro de 2026. São aceites contribuições em português, inglês, espanhol e francês.

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