Quarta-feira, 26 de Março de 2025
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Chamada para Trabalhos (Vol.4, N.1): Abordagens Críticas à Ficção Especulativa

Data de abertura: Data de encerramento: Países: Portugal

Chamada para artigos, Ciências Humanas, Estudos Interdisciplinares

Chamada para Trabalhos

estrema: revista interdisciplinar de humanidades

Vol.4, N.1: Mundos Imaginados: Abordagens Críticas à Ficção Especulativa

 

A estrema: revista interdisciplinar de humanidades, uma publicação online e com dupla arbitragem anónima em linha do Centro de Estudos Comparatistas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (CEComp-FLUL), está com uma chamada aberta para artigos e recensões para o primeiro número do seu Volume 4, até ao dia 12 de Maio de 2025. O número anterior acolheu reflexões, na forma de artigos, recensões críticas e entrevistas, sobre a dicotomia vida/morte, através de uma perspectiva interdisciplinar, comparatista e inovadora. Em 2025, lançamos a primeira chamada da estrema especificamente focada numa área de trabalho: a Ficção Especulativa.

A Ficção Especulativa é um género amplo e imaginativo que explora possibilidades além das restrições da realidade, combinando elementos de ficção científica, fantasia, terror, ecocrítica, cyberpunk, entre outros. Funciona como uma lente através da qual autores (escritores, cineastas, etc.) e leitores podem examinar a experiência humana ao perguntar ‘e se?’ — seja ao imaginar futuros distantes, mundos paralelos ou sociedades moldadas por magia e/ou tecnologia. Enraizada tanto na criatividade quanto na reflexão crítica, a Ficção Especulativa muitas vezes desafia normas sociais, reflecte ansiedades contemporâneas e reimagina os limites do conhecimento, do poder e da existência. Desde os cenários futuristas da ficção científica até os reinos míticos da fantasia, o género oferece um espaço rico para a narrativa, que expande fronteiras e desperta tanto o deslumbramento quanto a introspecção.

A publicação do romance Frankenstein de Mary Shelley, em 1818, marca o surgimento da ficção científica, género que, a par do terror e da fantasia, constitui um dos alicerces do universo da Ficção Especulativa enquanto movimento literário. Todavia, esta categoria ainda é dominada pelo género masculino, sendo que, em 1999, as mulheres representavam apenas 36% dos escritores de Ficção Especulativa inscritos no Science Fiction and Fantasy Writers of America. Já no século XXI, autoras como Ursula K. Le Guin, Connie Willis e Carolyn Janice Cherry têm obtido o reconhecimento da crítica e um vasto sucesso comercial com o lançamento de obras que abrangem temáticas como o avanço tecnológico, o sobrenatural e a exploração de mundos alternativos e realidades paralelas.

 

No campo dos estudos feministas, ecológicos e científicos, a bióloga e filósofa Donna J. Haraway propõe um outro modo de pensar a Ficção Especulativa, atribuindo significados múltiplos ao termo ‘SF’, entre os quais ‘science fact’, ‘science fiction’, ‘speculative fabulation’, ‘speculative feminism’ e ‘string figures’. SF diz respeito a práticas simultaneamente experimentais e responsáveis de criação de mundos, algo que Haraway considera particularmente urgente no contexto do Antropoceno. Não pertencendo exclusivamente ao domínio da ficção, SF possibilita, então, o envolvimento de diferentes espécies, criaturas e ciborgues num fazer-com de mundos, cosmologias e camas de gato que se constituem como alternativas ao antropocentrismo.

A Ecocrítica contribui, portanto, para a apreciação de obras de Ficção Especulativa ao destacar a agência dos elementos naturais e da vida não-humana. A emergência da chamada ‘ficção climática’ (cli-fi) projeta futuros marcados por cenários climáticos catastróficos que respondem à exploração humana. Na ficção contemporânea decolonial, romances como A Morte e o Meteoro (2019), de Joca Reiners Terron, abordam tais ansiedades desde uma junção entre passado e futuro, questionando a exploração materialista, antropocêntrica e eurocentrada. Através da ideia de que ‘o futuro será ancestral’, estéticas decoloniais como o afrofuturismo e o pós-indigenismo convidam a uma reorganização das relações entre cultura e natureza desde seu potencial para imaginar alternativas ao progresso histórico.

Já os princípios da ficção de fantasia foram discutidos pela primeira vez por J. R. R. Tolkien na sua palestra seminal “On Fairy Stories” (1939), na qual argumenta que o encantamento é o objetivo primordial de qualquer obra de fantasia. No entanto, o género tem-se mantido difícil de definir. A definição mais persuasiva que surgiu é a de Brian Attebery, que propõe um "conjunto difuso" para a fantasia, definindo-a não pelos seus limites, mas pelo seu centro, e, para o autor, O Senhor dos Anéis encontra-se no centro do alvo (1992, 12–13, tradução dos editores). Por sua vez, Farah Mendlesohn defende que a fantasia assenta numa "dialética entre autor e leitor para a construção de um sentido de maravilhamento, sendo uma ficção de construção consensual da crença" (2008, 8, tradução dos editores). O conteúdo da fantasia, segundo a maioria dos autores, consiste no impossível ou naquilo que desafia as leis naturais do Mundo Primário.

A Ficção Especulativa explora ainda a relação entre a linguagem e a percepção da realidade, como exemplificado nas obras de Jorge Luis Borges, Yoko Ogawa e Ted Chiang. Ao combinar filosofia com o uso da linguagem falada, matemática e lógica, desafia noções convencionais de tempo, memória e existência — proporcionando, assim, uma realidade maleável e completamente subjectiva.

Desta forma, a estrema apela ao contributo de todos os estudantes, de qualquer ciclo do ensino superior, investigadores integrados ou independentes, bem como outros interessados que procurem trabalhar as potencialidades interdisciplinares e intermédia da Ficção Especulativa, incentivando propostas que, sendo comparatistas na sua raíz, dialogam com a imensidão de possibilidades na criação de (outros) mundos.

 

Eixos temáticos possíveis, mas não exclusivos:

  • Estudos de Terror

  • Estudos de Fantasia

  • Distopias/Utopias

  • Genre Studies

  • Narratologia

  • Monstruosidades

  • Estudos Cinematográficos, Literários e de Videojogos

  • Ecocrítica

  • Estudos de Género


 

Directrizes

Prazo de submissão: 12 de Maio de 2025

Notificação de aceitação de trabalhos para revisão por pares: Entre Julho e Agosto de 2025

Envio de submissões: estrema.cecomp@letras.ulisboa.pt

Idiomas: Português e Inglês.

Todas as contribuições devem ser impreterivelmente e exclusivamente submetidas para o e-mail indicado e devem conter o nome e apelido do autor, endereço de e-mail, afiliação académica, código ORCID, se aplicável, e uma breve nota biográfica (máximo de 100 palavras).

As propostas devem estar em Times New Roman, tamanho 12, espaçamento 1.5, com um mínimo de 4000 palavras e um máximo de 7000 (incluindo notas de rodapé e lista de referências). Não é permitido o uso de numeração de páginas, indexação e/ou qualquer outro tipo de formatação automatizada.

Todas as citações e referências devem seguir o sistema Autor-Data do The Chicago Manual of Style: 17ª Edição.

É indispensável que todas as propostas sigam as Directrizes de Autor, disponíveis aqui. Propostas que não sigam estas directrizes serão rejeitadas sem comentários adicionais.


 

Referências

Attebery, Brian. 1992. Strategies of Fantasy. Indiana University Press.

Davin, Eric Leif. 2006. Partners in Wonder: Women And the Birth of Science Fiction, 1926-1965. Lexington Books.

Martínez Fabre, Mario-Paul, e Fran Mateu. 2020. Melted Reality: New Proposals from the Fantastic Aesthetics. Massiva, Grupo de Investigación UMM.

Mendlesohn, Farah. 2008. Rhetorics of Fantasy

. Wesleyan University Press.

Nevins, Jess. 2020. Horror Fiction in the 20th Century: Exploring Literature’s Most Chilling Genre. Praeger.

Peirse, Alison, ed. 2020. Women Make Horror: Filmmaking, Feminism, Genre. Rutgers University Press.

Roas, David. 2019. “El Monstruo fantástico Posmoderno: Entre La anomalía Y La domesticación.” Revista De Literatura 81 (161): 29–56. https://doi.org/10.3989/revliteratura.2019.01.002.

Sousa, Maria Leonor Machado de. 1979. O «Horror» na Literatura Portuguesa. Instituto de Cultura Portuguesa.

Stuart, Robert. 2022. Tolkien, Race, and Racism in Middle-earth. Palgrave Macmillan.

Todorov, Tzvetan. 1973. The Fantastic: A Structural Approach to a Literary Genre. Tradução de Richard Howard. The Press of Case Western Reserve University.

Tolkien, J. R. R. 1997. The Monsters and The Critics and Other Essays. HarperCollins.

Wolf, Mark J. P. 2012. Building Imaginary Worlds: The Theory and History of Subcreation. Routledge.

Wolf, Mark J. P., ed. 2018. The Routledge Companion to Imaginary Worlds. Routledge.

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