Chamada de trabalhos da revista Remate de Males para o dossiê: "Surrealismos"
Data de abertura: ⋅ Data de encerramento: ⋅ Países: Brasil
Dossiê Temático: Surrealismos: das origens literárias aos prolongamentos transnacionais
Editores convidados: Gisela Bergonzoni (IEL-Unicamp) e Gabriel Zacarias (IFCH-Unicamp)
Em 2024, muitas comemorações ocorreram por ocasião do centenário do Manifesto do Surrealismo. O texto redigido por André Breton em 1924 pode ser tido, de fato, como texto fundador do movimento surrealista. Mas é importante lembrar que o movimento tem seus inícios anos antes, quando o mesmo André Breton, juntamente com Louis Aragon e Philippe Soupault, lança a revista Littérature, ainda inspirada pelo influxo dadaísta que deságua em Paris com a chegada de Tristan Tzara. Associado no imaginário atual a uma poética da imagem, o surrealismo tem seus primeiros passos, na verdade, como criação literária. E é na experimentação literária conjunta que Breton e Soupault descobrem a escrita automática, com a qual produzem Les Champs magnétiques em 1919. Primeiro escrito propriamente surrealista, é em boa parte graças a essa experiência que Breton sustentará, alguns anos depois, quando redige o Manifesto, que o surrealismo pode ser definido como “automatismo psíquico puro”.
Com o automatismo psíquico os surrealistas não buscavam apenas uma nova forma de escrita. Muito além disso, procuravam desmontar o controle da razão e da moral, buscando uma forma de pensar e agir que fosse radicalmente distinta daquela da civilização ocidental, cuja barbárie da Primeira Guerra muitos de seus membros conheceram de perto. A aposta tinha suas raízes, como se sabe, nas descobertas da psicanálise recém-criada por Sigmund Freud. O surrealismo mergulhava no inconsciente e o descobria como um depositário inusitado de imagens poéticas. Não à toa, um jovem psicanalista próximo aos círculos surrealistas, Jacques Lacan, revolucionaria mais tarde a psicanálise ao propor que o inconsciente seria estruturado como linguagem. Os surrealistas encontravam indícios dessa linguagem do inconsciente nas associações inusitadas na escrita de Lautréamont, escritor que retiram do esquecimento. O surrealismo é pródigo em criar uma lista de precursores, e seu impacto estende-se sobre a história literária também em retrospecto.
Enquanto movimento de vanguarda, o surrealismo distingue-se de tantos outros “ismos” que marcaram os anos heroicos do modernismo ocidental. Se esses foram em sua maioria exemplares de uma teleologia eurocêntrica, hoje redescobre-se cada vez mais a dimensão anticolonial e transnacional do surrealismo, um movimento especialmente interessado por formas de pensar não-europeias e, portanto, rapidamente aclimatado em diferentes cantos do globo. Exposições recentes, como Surrealism Beyond Borders (Nova York e Londres), destacaram o internacionalismo do movimento, fortemente presente em locais distintos como o México ou o Egito. No Caribe, Édouard Glissant, conhecido escritor e teórico literário pós-colonial, mantém também relações com o movimento. No Brasil, o surrealismo não deixou marcas menores. Visitado em mais de uma ocasião pelo poeta Benjamin Péret, o país viu laços se estabelecerem desde cedo com o movimento. As colaborações de Péret com o grupo da Revista de Antropofagia são disso um exemplo. Ismael Nery e, através deste, Murilo Mendes, também se aproximam das ideias surrealistas. Mais tarde, Maria Martins, que conviveu com os surrealistas exilados nos EUA durante a Segunda Guerra, desenvolveu uma escultura ao mesmo tempo surrealista e amazônica, constituindo um novo elo do surrealismo no país, que finalmente contará com um grupo surrealista instituído nos anos 1960, constituído em torno de Sergio Lima e a revista A Phala.
Convidamos pesquisadores a submeterem artigos que abordem a multiplicidade do surrealismo em suas relações com a literatura. Em consonância com as reflexões mais recentes sobre a história do movimento, encorajamos artigos que abordem sua dimensão transnacional e indiquem prolongamentos do surrealismo para além do território europeu. Estudos da presença surrealista no Brasil serão particularmente bem-vindos. Apesar do foco prioritário da revista no âmbito literário, serão aceitas submissões referentes ao campo das artes visuais, sobretudo quando postularem reflexões relativas à linguagem.
Prazo para envio: até 17 de agosto de 2025
Remate de Males é uma publicação semestral do Departamento de Teoria Literária do Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP e tem por finalidade a divulgação de artigos, resenhas, entrevistas e fontes documentais relevantes para os estudos literários. A revista aceita colaborações vinculadas à teoria, à crítica e à história literárias.