Este dossiê se propõe a reunir textos autorais e traduções que reflitam acerca do problema da crença, contando com contribuições de diversas áreas do conhecimento: literatura, filosofia, antropologia, sociologia, estudos religiosos, história e psicanálise.

Pretende-se explorar o ponto paradoxal da crença: contígua à verdade – o filósofo Renato Lessa pôde mesmo escrever que “toda crença pressupõe uma experiência com a verdade” (Lessa, R., 2019, p. 93) –, ela participa contudo do campo da ficção, no sentido de que a certeza epistemológica que oferece é de ordem subjetiva. Por um lado, a leitura de obras de ficção exige a “suspensão da descrença”, entendendo-se por essa expressão o abandono da pergunta pela verdade ou falsidade do conteúdo da obra, abrindo espaço para uma outra verdade, a verdade problematizante dos estados subjetivos (idem, 2014) – mais afeita à crítica do que à crença. Por outro, pela ficção que se dá no cotidiano, a subjetividade enraíza-se no campo simbólico da comunidade, donde uma questão rica e ainda inexplorada: que relação pode haver entre a mímesis atuante nessa dimensão da vida, a ficcionalidade que ela mobiliza, e a experiência da crença?

Também não se pode deixar de indagar a dimensão propriamente religiosa da crença, em sua incidência sociológica e política, de extrema importância no contexto tenso da política nacional. Estendendo-se da mística cristã ao fenômeno contemporâneo das igrejas neopentecostais, a relação entre a fé no suprassensível e a atuação no mundo deve ser pensada com urgência.

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