Quinta-feira, 28 de Março de 2024
Congressos

História e Populismo no Portugal Contemporâneo

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História

Seminário organizado pelo grupo de investigação Cultura, Identidades e Poder do Instituto de História Contemporânea, com coordenação de Fernando Dores Costa, Gil Gonçalves e José Neves.

 

Programa e resumos (PDF do programa)

 

09h30 | Abertura

09h45 | Fátima Sá (ISCTE-IUL), Do povo e do popular na historiografia da segunda metade do século XX

Se o substantivo povo, considerado como categoria analítica, andou um tanto arredado da historiografia do século XX posterior à renovação teórica e metodológica iniciada com a história dos Annales, preocupada em geral com uma construção mais fina das categorias sociais, o mesmo não sucedeu com o adjectivo popular. Como recentemente notou o historiador italiano Alberto Benigno, os anos 70 e 80 foram férteis no uso desse adjectivo associado ao termo cultura, dando origem a uma fértil área de estudos que se designou “história da cultura popular”, afirmando-se como um terreno consolidado e até “como um novo cânone interpretativo”. No livro Las palabras del tiempo. Un ideario para pensar historicamente Benigno evoca a importância de historiadores como Jacques le Goff para a França medieval ou o britânico Peter Burke, autor do famoso Popular Culture in Earl Moderm Europe, ou ainda o êxito de “Il formaggio e i vermi” de Carlo Guinzburg e a inspiração em Bakthin, considerando esse “cânone” produto de um momento e de um tempo muito particulares que uma vez ultrapassados teriam condenado a temática à irrelevância. É a esta luz que se procura pensar nesta intervenção o uso das categorias povo e popular na historiografia da segunda metade do século XX associado não só ao conceito a cultura mas também ao de revolta e de protesto colectivo de modo a perceber os caminhos abandonados e os caminhos prosseguidos neste campo até aos dias de hoje

10h15 | José Luís Garcia (ICS — ULisboa), A hipótese do populismo no ensaísmo histórico de Hermínio Martins

O problema que organiza a comunicação a realizar diz respeito à questão do populismo como uma das possíveis chaves conceptuais nos ensaios históricos de Hermínio Martins. O tratamento deste problema tem como corpus de análise os quatro estudos que estruturam o livro Classe, Status e Poder e o longo ensaio sobre As Mudanças de Regime em Portugal no século XX. Mobilizando Hermínio Martins nestes seus trabalhos conceitos oriundos da história, filosofia política, sociologia e ciência política, a exploração da hipótese do populismo na sua obra histórica é pertinente não apenas porque utilizou explicitamente essa noção, mas sobretudo porque as suas análises sobre o Portugal contemporâneo estão orientadas por uma perspectiva que incide nas aporias que compõem as experiencias modeladas pela ideia de soberania do povo e no espaço enevoado entre os regimes autoritários e as democracias liberais.

10h45 | Debate

11h15 | Pausa para café

11h30 | Fernando Dores Costa (IHC — NOVA FCSH), A tradição contra a tirania e os «excedentários»: o populismo visto a partir do primeiro liberalismo

A partir de uma tradição de comunicação política que se encontra já no primeiro liberalismo (1820-1823), esboça-se uma contribuição para os debates sobre o “populismo”, caracterizado seja como um estilo, uma síndrome ou a contestação da democracia de tipo elitista. Proponho uma relação do populismo com o nacionalismo e com a identificação dos «que estão a mais», feita no âmbito das formas divergentes de uma desejada mudança social.

12h00 | Diego Palacios Cerezales (Universidade Complutense de Madrid), Saldanha, o povo e as aporias da modernidade

En esta comunicación voy a partir de los trabajos de Roger Dupuy sobre la noción de “política popular” y sus relaciones con el populismo, poniendo a prueba su capacidad de iluminar una mejor comprensión de las dinámicas políticas del Portugal de 1850-1874. Con esa perspectiva, exploraré las coyunturas de crisis política y agitación popular del periodo 1850-1871 y el potencial populista del mariscal Saldanha como encarnación, a ojos de muchos portugueses, de una alternativa no tradicionalista a tres institucionalizaciones claves de la modernidad liberal: los partidos, el parlamentarismo y la burocracia.

12h30 | Debate

13h00 | Pausa para almoço

14h30 | Júlia Leitão de Barros (ESCS-IPL / IHC — NOVA FCSH), O povo como sujeito político e o movimento republicano

Os apelos ao “bom povo republicano”, a retórica anti-oligárquica, a idolatria aos chefes e, sobretudo, a demagogia, têm sido apontados como traços que denunciam um viés populista do Partido Republicano Português. E tem sido grande o realce dado à manipulação popular levada a efeito por líderes carismáticos, capazes de conduzir ao engano, como por magia, o povo ingénuo. Porém, a indefinição teórica e metodológica em torno do conceito de populismo, bem como a sub-representação do movimento em detrimento do partido, não têm contribuído para a compreensão do republicanismo português. Na viragem do século XIX para o século XX a defesa da democracia decorria em vários terrenos de luta, num deles pugnava-se pela imposição de um princípio político, a ideia-força de igualdade política. No movimento republicano, o sector republicano radical utilizou formas de comunicação política que procuraram impor um novo âmbito à atividade política, mais alargado, inclusivo e participado. Não foi isento de contradições e ambiguidades o uso pelos republicanos do sujeito político que nomearam, o povo. Procurarei olhar imprensa diária como elemento da experiência quotidiana do político, valorizando o seu papel na construção de sentido e na definição de estratégias políticas.

15h00 | Armando Malheiro da Silva (CITCEM — FLUP), O Sidonismo: uma experiência republicana populista

A efémera e trágico experiência sionista, protagonizada pelo Major de Artilharia e Lente de Matemática em Coimbra, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Pais (1872-1918), assassinado enquanto Presidente da República a 14 de dezembro, gerou desde o seu começo controvérsia e opostas leituras: suscitou hagiógrafos e detratores, estes nas fileiras republicanas de Democráticos ou afonsistas, a evolucionistas e unionistas; aqueles nas hostes conservadoras, católicas, monárquicas e também republicanas (moderadas). E tanto adeptos e adversários não hesitaram, após o fim do curto fenómeno, a associá-lo ao fascismo subsequente, em relação ao qual teria sido um prenúncio ou um ensaio protofascista. Tivemos já ocasião de analisar e desmontar esta tese, assim como podemos no decurso da mesma investigação confirmar a matriz populista do Sidonismo, na exacta medida em que Vasco Pulido Valente classificou a 1ª República (1910-1926) com o título oportuno de “O Poder e o Povo”. O apelo ao Povo urbano, pequeno-burgueses e de assalariados em diversos setores de actividade, por parte da República deu-lhe um cunho populista, assim como a necessidade, sentida ao longo de vinte e seis atribulados anos, de ganhar a difícil e volátil confiança de um Povo mais vasto, nomeadamente o Povo rural, distante do centro político, analfabeto e manipulado pelos caciques conservadores e pela Igreja. Pretende-se, aqui, explicar na medida do possível o populismo sidonista.

15h30 | Debate

16h00 | Pausa para café

16h15 | Gil Gonçalves (IHC — NOVA FCSH), A transição populista: eanismo, otelismo e as eleições presidenciais de 1976

As eleições presidenciais de 1976 decorrem num momento ambíguo, situado na encruzilhada entre Revolução e “normalização”. Perante a persistência de ideias de futuro irreconciliáveis, Ramalho Eanes e Otelo Saraiva de Carvalho polarizam o debate eleitoral, assumindo-se como intérpretes das vontades do povo e nomeando como antagonistas aqueles que as ignoravam. Através da articulação de diferentes reivindicações e identidades políticas/sociais, ambos vão transcender os seus “apoios naturais” e a capacidade de mobilização dos partidos que os apoiavam. Tomando essa conjuntura enquanto “momento populista”, esta comunicação pretende reflectir acerca da cultura política do Portugal pós-revolucionário, evitando leituras essencialistas e “ilusões retrospectivas de fatalidade” quanto aos desfechos da Revolução.

16h45 | João Rodrigues (CES — Universidade de Coimbra), A ascensão dos populismos: uma crítica de economia política e moral à sabedoria económica convencional

A ascensão dos populismos tornou-se recentemente um tópico central nas ciências sociais, incluindo na Economia. Esta comunicação pretende avaliar as abordagens dominantes a um fenómeno multiforme, partindo do tratamento que a sabedoria económica convencional lhe tem devotado desde o diagnóstico sobre o chamado “populismo macroeconómico” do início dos anos noventa. Defender-se-á que, por trás de uma variedade de métodos empregues, da econometria à análise de política económica comparada, aí tem dominado uma abordagem politicamente farmacológica, pressupondo que estamos perante o equivalente sociopolítico de uma doença económica, que tem de ser tratada através de modificações mais ou menos marginais na economia política neoliberal dominante desde os anos oitenta. A história económica do populismo é tributária desta abordagem, como se verá ao analisar o recente contributo de Barry Eichengreen sobre a “tentação populista”. De facto, são muito poucos os economistas, convencionais ou não, que distinguem normativamente os populismos e que os têm analisado como sintomas de problemas estruturais mais amplos, que requerem mudanças institucionais significativas. Influenciado até certo ponto por Karl Polanyi, Dani Rodrik é uma dessas exceções, tendo chegado mesmo ao ponto de defender que uma certa forma de populismo económico poderia oferecer um útil contraponto a certas tendências globalistas e pós-democráticas na economia. Através da análise crítica do seu pensamento, das suas virtudes, mas também dos seus limites, procurar-se-á elaborar um quadro de economia política e moral, integrando poder e comunidade, capaz de ver numa variante de populismo uma crítica razoável e uma alternativa decente à economia política dominante, enfrentando as tarefas urgentes de desfinanceirização e de desglobalização. Este quadro será usado para tentar perspetivar os populismos no quadro da evolução recente da economia política portuguesa.

17h15 | Debate

18h15 | Fim

 

 

Notas Biográficas

Fátima Sá | De entre os projectos de investigação em que participa, destaca-se o projecto internacional Iberconceptos, onde foi coordenadora da equipa portuguesa desde 2005 e onde é, actualmente, directora do grupo: Linguagens da Identidade e da Diferença: classes, corporações, castas e raças. Directora da revista Ler História de 2014 a 2016, é membro do seu conselho de redacção. É autora/coordenadora, entre outras, das seguintes obras: Diccionario político y social iberoamericano, Iberconceptos II Javier Fernández Sebastián director, (co-editora e autora de diversas entradas) Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, Madrid, 2014, Tomo II , 10 vols; Diccionario político y social iberoamericano. Conceptos políticos en la era de las independencias, 1750-1850 Iberconceptos I, Javier Fernández Sebastián director, ( co-editora e autora de diversas entradas) Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, Madrid, 2009. Tomo I; D. Miguel (em co-autoria com Maria Alexandre Lousada), Circulo de Leitores, Colecção Biografias dos Reis de Portugal, 2006; Rebeldes e Insubmissos: Resistências Populares ao Liberalismo – 1834-1844, Ed. Afrontamento, Porto, 2002.

José Luís Garcia | É Investigador Principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, fez estudos doutorais na London School of Economics e é doutorado em Ciências Sociais pela Universidade de Lisboa com orientação de Hermínio Martins. Foi docente de Sociologia no ISCTE-IUL durante 20 anos e entre os livros que editou ou co-editou encontram-se: Media and Portuguese Empire , Palgrave Macmillan, 2017, Salazar, o Estado Novo e os Media, Edições 70, 2017, Pierre Musso and the Network Society: From Saint-Simonianism to the Internet, Springer, 2016, Jacques Ellul and the Technological Society in 21st Century, Springer, 2013 e Razão, Tempo e Tecnologia. Estudos em Homenagem a Hermínio Martins, Imprensa de Ciências Sociais, 2006.

Fernando Dores Costa | Iniciou ou renovou, desde 1985, a investigação de vários temas de história social portuguesa dos séculos XVII, XVIII e XIX, integra presentemente o Instituto de História Contemporânea da UNL. Autor ou co-autor de A Guerra da Restauração – 1641-1668 (2004), Insubmissão. A aversão ao serviço militar em Portugal no século XVIII (2010) e D. João VI. (2006; São Paulo, 2008) e de cerca de 60 outras publicações. Doutorado em Sociologia e Economia Históricas pela Universidade Nova de Lisboa. Trabalha presentemente sobre o primeiro período liberal (1820-1834). 6-01-2020

Diego Palacios Cerezales | Investigador Ramón y Cajal en la U. Complutense de Madrid e asociado al IHC de la UNL-NOVA. Investiga la historia de los movimientos sociales y de la policía. Ha publicado, entre otros, los libros O poder caiu na rua (ICS, 2003) Portugal à coronhada (Tinta da China, 2011) y Estranhos corpos políticos (Unipop, 2014) y actualmente está escribiendo una historia transnacional de las recogidas de firmas.

Júlia Leitão de Barros| Doutorada em História, pela F.C.S.H., da UNL, em 2014, com a tese O Jornalismo Político Republicano Radical. O Mundo (1900-1907). Nos estudos jornalísticos destacam-se as publicações: “O Cerco ideológico do Estado Novo na imprensa de província, Caleidoscópio, Revista de Comunicação e Cultura, nº5 e 6, 2004/ 2005, pp. 265 – 300; “O Jornalismo político d’O Século e do Diário de Notícias”, Comunicação Pública, vol.10, nº17, 2015, [formato digital]; “Redações abertas: fontes informativas e terreno de implantação dos jornais políticos” in Espaços, Redes e Sociabilidades, Cultura Política no associativismo contemporâneo, coord. Joana Dias Pereira, Maria Alice Samara, Paula Godinho, IHC, FCSH, Lisboa, 2016 [formato digital].

Armando Malheiro da Silva | Licenciou-se em Filosofia pela Faculdade de Filosofia de Braga da Universidade Católica Portuguesa e em História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Obteve o diploma do curso de bibliotecário-arquivista da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e, em 1999, doutorou-se em História Contemporânea na Universidade do Minho. É professor catedrático em Ciência da Informação, do Departamento de Ciências da Comunicação e da Informação da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Tem repartido as suas pesquisas e publicações pela Ciência da Informação, pela História Política e das Ideologias em Portugal nos sécs. XIX-XX, pela História Social e da Família e pelos Estudos Locais.

Gil Gonçalves | Licenciado em História pela FCSH-UNL e mestre em História Contemporânea, pela mesma faculdade, com a dissertação intitulada “Eanismo, Otelismo e a questão da «normalização» democrática” (2019). Actualmente é doutorando em Estudos sobre a Globalização, incidindo a sua investigação sobre os apanágios do discurso populista e os momentos em que este ganhou tracção no Portugal do século XX. É bolseiro de doutoramento da FCT.

João Rodrigues | Professor Auxiliar da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e Investigador do Centro de Estudos Sociais, onde integra o Núcleo de Estudos sobre Ciência, Economia e Sociedade. Doutorado pela Universidade de Manchester, a sua investigação tem-se debruçado sobre temas de economia política, da história do neoliberalismo à financeirização do capitalismo em Portugal e à crise do Euro, sendo autor de diversas publicações nestas áreas, incluindo em revistas académicas como o Cambridge Journal of Economics ou a Review of International Political Economy. É ainda coautor do blogue de economia política Ladrões de Bicicletas e membro do Conselho Editorial do Le Monde diplomatique – edição portuguesa.

 

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